domingo, 29 de julho de 2007

Bendita a dica...

Sexta-feira, 27 de julho, abro minha caixa de e-mail e lá está:

Oi Dani! Tudo bem?
Bom, esses tempos eu li um livro chamado Gosto de Uva, escrito pelo Frei Betto e o achei muito interessante. O livro consiste em uma coletânea de crônicas sobre diferentes assuntos, desde políticos até os transcendentes. É incrível como o autor consegue escrever sobre assuntos políticos não apenas com um tom imperativo e severo, mas também usando calma e paciência de darem inveja!

Bom, acho que você já deve conhecer um pouco sobre o Frei Betto. Pelo menos deve saber que suas idéias dispensam comentários ou críticas. Se você ainda não o conhece, vale a pena ler o livro para conhecê-lo melhor!

O mais interessante, Dani, é que entre tantos textos de cunho político o que mais me cativou dispensa a política. Trata-se de uma exaltação à vida humana, aos sentidos humanos, às atitudes cotidianas e, mais ainda, Frei Betto consegue descrever sentimentos indescritíveis! Isso parece meio impossível e contraditório, mas não é!
Então, está em anexo o texto inteiro, mas só vou pedir uma coisa (algo que não se deve pedir) : leia com atenção, porque o que o deixa especial são seus detalhes. Cada palavra deve ter sido escolhida a dedo. É um texto meio longo então leia-o quando tiver tempo! Bjo nega até mais.

Eu recebi esse e-mail de um cara chamado Rafael Zanetti; ele é alto, simpático, tem um coração bom e apesar de estudar engenharia, gosta muito de literatura.

Adorei a indicação do Rafão e por isso segue o texto do Frei Betto:


Benditas fomes

Benditos os que têm fome de si e mergulham no âmago de ser, arrancam dissabores do paladar medíocre, farto de migalhas caídas da mesa de Narciso. E os insaciados no apetite de beber do próprio poço e devorar gorduras impregnadas nas reentrâncias da alma.

Benditas as mulheres famintas de amor, feitas de fio de renda, a tecer a vida na magia de pequenos gestos cotidianos: a cozinha limpa, o feijão catado, a cama arrumada e o vaso da janela regado de ternura. Elas conduzem a lua como um farol que, mês a mês, atrai seus corpos para rubros mares cheio de vida.

Bendita a fome itinerante dos homens ávidos de saber, curioso quanto aos mistérios desse breve existir,e cujas as mãos transmutam árvore em mesa, trigo em pão e leite em manteiga. Generosos, não precisam exibir espadas para provar que são guerreiros. Espalhada à sua volta, a sombra do aconchego aninha a família em segurança.

Benditos os que reverenciam o sol, a flor, a água e a terra, e trazem um coração ao ritmo das estações , confeiteiros de primaveras espirituais. Esses sabem encher suas taças de chuva e assar o pão no calor de amizades.

Benditos todos que se irmanam ao canto telúrico de Francisco e dançam ao ritmo alucinado dos girassóis de Van Gogh, impregnados da sabedoria búdica que não se algema à nostalgia do passado, nem se precipita na ansiedade do futuro.Eles saboreiam o presente como inestimável presente.

Benditas a manhã reinaugurando a vida após o sono; a idade esculpindo rugas carregadas de histórias;e todos que, saciados de anos, não temem o convite irrecusável das bodas de sangue que, afinal, haverão de saciar a nossa fome de beleza.

Benditos os bem aventurados na ânsia de ver repartido o pão da vida, sem encher a bolsa de sementes de podridão. Estes sentam-se à mesa com espírito solidário e têm direito à embriaguez do vinho que, transubstanciado, encharca o coração de alvíssaras.

Benditas as mãos que traduzem sentimentos e semeam caricias, aplacando a fome de afeto. E os olhos repletos de luzes e as palavras floridas de beijos. E esse voraz apetite de silêncio, leve como o vôo de um pássaro.

Benditos a gula de Deus, os vulcões ativados nas entranhas, o arco-íris da pluralidade de idéias, a confraria de boas ações, os livros que nos lêem, os poemas ecoados no centro da alma, a rua deserta ao alvorecer, o bonde invisível, a vida sem medos.

Bendita a ira contra os pincéis que rasgam telas; a luxuria dos bales musicados por virtudes; a preguiça dos sinos de igrejas; a avareza de quem se guarda nos vícios; e a lenta maneira de fazer crescer plantas, cumplicidades e gente.

Benditas as fomes de transcendência, de prefigurações do eterno, de jovialidade do espírito, do bolo fatiado pelo cuidado materno, de vertigens místicas, de astros acelerados pela rotação de tantos sonhos redivivos.

Benditos os machados cientes que seus cabos são feitos de árvore e as gaiolas abertas à liberdade; as agulhas que tecem o avesso da dissolidariedade e as facas de pontas arredondadas; a musica de emoções indeléveis e os espelhos que refletem as mais saborosas oferendas da existência.

Benditas as fomes insaciáveis: de saber e de sabor; de despudor no amor; de Deus sob todos os nomes inomináveis. Fome do ócio sem culpa, de alegria interminável, de saúde e de prazer. Fome de paz. Saciada plenamente por justiça – a mais bendita das fomes, capaz de erradicar a fome maldita.


Obrigada mesmo Rafa! E vale muito a pena conhecer o trabalho do Frei Betto e sua trajetória, só pra citar ele já foi assessor do Lula e escreve para várias publicações, dentre elas a Caros Amigos. (http://www.garamond.com.br/node.php?id=254)

quinta-feira, 26 de julho de 2007

Mais idéias improdutivas e desconexas que as férias proporcionam...

Devido a pedidos incessantes, suplicantes e irrecusáveis resolvi postar... Mas não exijam muito de mim, essas férias não têm me proporcionado momentos criativos e por essa razão vou mandar uma letra de música. Já que nesse último mês só pude me dar conta de três coisas:

- A primeira é que eu gostaria de ter sido jornalista por volta das décadas de 30 e 40, porque como tenho lido no Cobras Criadas*, os profissionais daquela época pareciam não se importar tanto com o compromisso de relatar com veracidade os fatos. E especificamente o biografado David Nasser gostava e muito de fantasiar e inventar quando escrevia importantes reportagens pra famosa revista O Cruzeiro**. Mas antes preciso me explicar! Eu digo que isso seria algo bacana se os leitores tivessem consciência e a noção clara de que estavam lendo mais ficção do que realidade... Consta no livro que as pessoas sabiam mais ou menos que Nasser gostava de aumentar os fatos, mas não que essa fosse a proposta de seu trabalho.

Forjar e fantasiar em cima de acontecimentos são atitudes bem comuns no jornalismo, mas nessa era google as coisas se complicaram (ou não). A checagem está acessível a qualquer um e mais do que nunca o jornalista deveria se comprometer em informar com precisão, deveria né.
O jornalismo do faz-de-conta me encanta muito, o que eles chamam de jornalismo literário ou new jornalism, mas acredito que me comprometer com o real da forma mais objetiva possível pode ajudar e muito o público. Já que a segunda coisa de que me dei conta nessas férias envolve a forma como a mídia trata certos assuntos...

- Como eu já adiantei, pude me dar conta do nojo que eu sinto pela forma como a mídia explora temas polêmicos! Não que fosse novidade pra mim, mas ver como as pessoas recebem a enchurrada de informações sensacionalistas foi horrível.
Passei uns dias na cidade onde nasci, Votuporanga (isso mesmo! haha) , e lá gastei um bom tempo analisando as reações das pessoas que estavam a minha volta por causa do desdobramento do caso que envolveu o avião da TAM. Não há dúvidas de que o acontecimento mobilizou e comoveu o país todo, mas me pergunto até que ponto a mídia ajudou a informar realmente a população.

A TV é o principal (e quase único) meio de comunicação que a pessoa que estive observando tem contato. Pois bem, ele é um homem de mais de 60 anos, pouco estudou e sempre trabalhou com serviços braçais. Todas as noites essa pessoa liga a TV e recebe notícias aos montes, tanto através de Datena como também do memorável casal de apresentadores do JN. Mesmo entendendo absolutamente nada a respeito de aviões, de tragédias ou de mecânica, esse homem assiste aos jornais e emite muitos comentários por aí, apenas repetindo tudo o que ouvira. Sempre se mostrando comovido e revoltado, o homem faz questão de abordar o assunto em todas as rodas de conversa e pouco se importa com opiniões diferentes, afinal se a Fátima disse...

Vendo esse comportamento eu fiquei me perguntando até que ponto seria necessário que ele conversasse tanto a respeito. Não que eu acredite na alienação como melhor forma para evitar o não-sofrimento, mas as informações que esse homem não se cansava de repetir eram pouco densas e não levavam em consideração diversos fatores. Ele dizia aos cotovelos que viajar de avião é a forma mais perigosa que existe para se locomover, sem levar em conta, por exemplo, as milhares de mortes ocorridas diariamente nas rodovias do país...

Espero não ter sido tããããão confusa assim! haha Minha intenção é expressar a revolta que sinto ao ver a exploração que a grande mídia faz com certos assuntos, sempre buscando o auto-favorecimento. Até porque a respeito das falcatruas e da corrupção que têm ocorrido por trás da manutenção do Pan, isso, ah isso ninguém menciona...

- Por fim e não menos importante, o que pude perceber nesse mês é o quanto eu adoro Zeca Baleiro! E foi por isso que comecei meu texto dizendo que postaria a letra de uma música e só. Mas (in)felizmente me empolguei e saiu isso aí! haha Esta letra é uma das que gosto mais:

Zeca Baleiro - Heavy Metal Do Senhor

O cara mais underground que eu conheço é o diabo
que no inferno toca cover das canções celestiais
com sua banda formada só por anjos decaídos
a platéia pega fogo quando rolam os festivais

Enquanto isso Deus brinca de gangorra no playground
do céu com santos que já foram homens de pecado
de repente os santos falam "toca Deus um som maneiro"
e Deus fala "aguenta vou rolar um som pesado"

A banda cover do diabo acho que já tá por fora
o mercado tá de olho é no som que Deus criou
com trombetas distorcidas e harpas envenenadas
mundo inteiro vai pirar com o heavy metal do Senhor


*COBRAS CRIADAS, LUIZ MAKLOUF
Uma resenha a respeito: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos/asp211120019993.htm

**"A revista O Cruzeiro surgiu no final dos anos 20, tendo sua primeira publicação em 10 de novembro de 1928. Patrocinada pelos Diários Associados de Assis Chateaubriand, O Cruzeiro é considerada a principal revista ilustrada brasileira do século XX." (http://www.traca.com.br/?tema=padrao&pag=revistaocruzeiro&mod=inicial)

domingo, 8 de julho de 2007

Poxa...

http://jc.uol.com.br/2007/07/06/not_143655.php


"Onde quer que você esteja, você sempre estará lá". (Rafa)

sexta-feira, 6 de julho de 2007

"Viver ultrapassa qualquer entendimento"


"Não entendo. Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender. Entender é sempre limitado. Mas não entender pode não ter fronteiras. Sinto que sou muito mais completa quando não entendo. Não entender, do modo como falo, é um dom. Não entender, mas não como um simples de espírito. O bom é ser inteligente e não entender. É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida. É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice. Só que de vez em quando vem a inquietação: quero entender um pouco. Não demais: mas pelo menos entender que não entendo”.
(Clarice Lispector)


Embora tenha se tornado um trecho bastante comum nos perfis do orkut - o que não é de todo ruim -, eu precisava transcrevê-lo aqui, porque as palavras de Clarice Lispector são lindas e fazem todo sentido, mais uma vez...

quarta-feira, 4 de julho de 2007

Festival Indie Rock

No final do mês haverá uns shows bem bacanas em São Paulo:

26 de julho - Magic Numbers, Moptop e Hurtmold
27 de julho - The Rakes, Mombojó e Móveis Coloniais de Acaju
Horário: 21h30

Pista 100,00
Camarote 120,00
Mezanino 140,00
http://www.viafunchal.com.br/shows.asp?ID=258

O difícil vai ser escolher em qual dia ir, Belém e eu iremos no primeiro provavelmente...
Bom, pra quem quiser tá aí a dica e o convite!


The Magic Numbers - I see you, you see me

terça-feira, 3 de julho de 2007

"Debate" MTV

Voltei pra casa em Americana, por isso tenho a minha disposição aqueles muitos canais da TV paga. Devo confessar que sentia falta disso, mas já passou, foi preciso um breve momento assistindo ao "Debate" MTV (entre aspas mesmo) para querer não assistir mais televisão. Eu sei que tenho mania de criticar e reclamar o tempo todo, mas dessa vez não dava pra não comentar.

O programa, teoricamente, deveria gerar um debate entre os convidados sobre o tema escolhido para aquela semana. Mas o que vi hoje não foi um debate, ou nada que seja digno de assim ser definido. O apresentador da vez é Lobão e não mais Cazé, o que achei uma troca ruim, e os convidados para o bate-papo descolado foram Renata Banhara (sim, a ex de Frank Aguiar, nosso deputado querido), uma tal de Marina Mantega (parente do senador), um cara que faz parte da produção da Playboy, uma blogueira que desconheço também, um consultor financeiro (ou analista de sistema, ou sei la o quê) e uma jovem universitária.

Bom, para que Renata Banhara tivesse sido convidada é fácil tentar adivinhar qual teria sido o tema, as opções possíveis não fogem de algo relacionado a roupas, sexo, brigas públicas, escândalos familiares, beleza (?), fofoca, Luciana Gimenez, silicone, empreendorismo no ramo das babaquices sem utilidade e por aí vai...

Enfim, entre tantos assuntos cruciais a serem discutidos, a MTV abordou a questão: a única possibilidade de ganhar notoriedade e fama para uma mulher é posando nua?

Depois de apresentar os convidados já é possível imaginar o que tive que presenciar na frente da TV. É óbvio que a discussão foi superficial e egocêntrica, pois de um lado estava Renata contando os percalços de sua vida e narrando (quase) tudo o que fez para chegar onde está. Já a tal Marina ficou contando que trabalha num meio onde o sexo masculino predomina, mas diz saber que é tão boa quanto os companheiros - e que recebe os mesmos salários - e por isso não se sente reprimida e mais, ela falou que posaria nua sim, mas não por necessidade. Sobre três eu me recuso a comentar. E ainda havia a universitária, pobre moça que aceitou o convite de se sentar à mesa de discussão com esse pessoal.

Resumindo, não houve discussão, apenas uma briga entre os estereótipos: a mocinha feia, inteligente e rebelde contra as mulheres gostosas e bem-sucedidas. Ah, esqueci de comentar a ilustre presença do apresentador, que é engraçado às vezes, só que estava muito mais preocupado em passar a imagem de homem sem pudores do que em mediar aquele bate-boca.

Enfim, poucas conclusões pude formular sobre o tema, mas sentir essa ponta de revolta com o que nos é oferecido pela mídia eu não pude evitar. A universitária ainda abordou questões legais como o aumento da violência doméstica sendo causado pela noção cada vez maior de que a mulher é objeto, é propriedade a ser cuidada e contemplada, ela ainda disse que a pornografia incita os estupros, o homem quer o que pode apenas ver na revista... Talvez ela tenha sido radical demais em alguns momentos, ainda assim são coisas importantes pra se pensar.

Agora se eu disser que Renata Banhara não deu sua contribuição ao debate estarei mentindo, já que após choramingar pelo preconceito que sofreu ao posar nua pela primeira vez, ela contou o que seu tio-avô disse ao vê-la na revista: "O que é belo é para ser contemplado, os que são contra isso tem mente provinciana". Fiquei muito emocionada, palavras de um grande mestre. Poxa MTV, vocês podem mais! (Ou não...)